segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Clichés


As coisas acontecem quando menos se espera,

e, ás vezes, a inspiração vem de repente. Vem de uma conversa tranquila de 2ª feira de manhã em que só se trocam novidades de fim-de-semana. Mas apercebemo-nos que não são só novidades de fim-de-semana, mas uma maneira diferente de ver a vida. E, embora seja um cliché que até uso muitas vezes, nunca lhe tinha dado tanto valor. Era só um chavão para terminar uma frase ou uma desculpa usada quando algo não teve o resultado esperado. Mas,

as coisas acontecem (mesmo) quando menos se espera, quando não as procuramos, não nos preparamos. Não temos tempo para criar defesas, para
- ("E se.."),
porque vêm do desconhecido e envolvem-nos completamente, levando-nos para um lugar novo, um lugar-incomum, longe das banalidades a que estamos habituados, dos argumentos empregues que nos convencem que

- "está tudo bem",

- "é mesmo assim",
dos truques, artimanhas, planos usados frequentemente para dar a volta a uma situação que não controlamos.
A minha envolvente mudou e os "Déja-vus" tornaram-se "Clichés". Já não estou só do lado de fora a ver as mesmas cenas repetirem-se uma vez atrás da outra, já não sou uma mera observadora. Sou um cliché, mas um bom cliché. Não daqueles vazios e sem sentido. E vejo mais clichés felizes da vida e apaixonados á minha volta, daqueles clichés que se sentem deslumbrados pelo inesperado. Porque (e como a Anatomia de Grey uma vez disse) é o inesperado que muda a nossa vida, que dá a volta ao nosso mundo.
Não é suposto ter que lutar por certas coisas, não é suposto ter que conquistar, ter que criar estratégias, demorar X tempo a responder a uma mensagem, ou responder um ausente

- "Pode ser.."

a um convite, quando só apetece gritar
- "SIM!"
É suposto ser natural, genuíno e tomar-nos plenamente, deitando por terra as defesas de outrora. Simplesmente, acontece. E depois do remoinho de emoções, de virar a nossa vida de pernas para o ar, paramos e pensamos
- "É mesmo isto!".




segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Resumindo e começando...

Entre triagem curricular, marcação de entrevistas, actualização da base de dados, impressão de cartas, arquivos, tento actualizar os últimos tempos. Lá fora, ao fundo, vejo o recorte da costa, vejo um céu pouco nublado e um sol que ainda pede praia. Mas o meu verão já acabou há quase um mês.
Faz hoje 4 semanas que comecei a estagiar. Parece menos. As 9 horas diárias aqui passadas todos os dias não custam a fazer e não é com esforço que saio da cama. Curiosamente, é também sem esforço que, 3 vezes por semana, saio daqui para ainda ter aulas, quando em anos passados acordar para ir para o ISPA era um sacrificio que muitas vezes aceitava não fazer.
Contemplo as recentes mudanças e gosto. Gosto de estar a trabalhar, de me sentir capaz, útil, de sentir que estão a apostar em mim (ainda que o trabalho seja pouco interessante). Gosto que seja temporário, que daqui a dois meses acabe e me esteja a ajudar a compreender o que não quero fazer para o resto da vida. Gosto de me sentir motivada por mim mesma, sem recompensas exteriores, apenas pessoais que tento aproveitar e encarar da melhor maneira.
Gosto de chegar ás aulas e ainda ter energia. De participar, querer dar o meu melhor e, acima de tudo, gosto que seja o último ano. Não que não tenha sido bom, que não goste do meu curso, da minha universidade, mas anseio por outros mundos, outras descobertas. Vejo tantas oportunidades, tantos sítios, que sinto-me limitada, aqui, constangida. Não sei o que o futuro me reserva, que voltas hei-de dar á vida e ela a mim, e isso não me assusta (o tempo todo..). Não me sinto a acabar o curso, mas a começar algo novo. E gosto.
P.S. - Apaixonei-me.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Freedom

Quem diria que um dia iria estar a reportar uma experiência de vida ao som de música trance, mas a escrita deste texto não podia ter outra banda sonora. Instantaneamente sinto os pêlos a arrepiar, borboletas lindas e fluorescentes a levantar voo dentro do meu estômago e a percorrer-me o corpo todo, os braços a moverem com despreocupação, o peito a palpitar, os pés a quererem sair do chão com destino para parte incerta, a cabeça a esvaziar, a focar-se no essencial.
Cedi á "chantagem emocional" do Javier e aceitei (bastante apreensiva) ir ao Freedom - festival de trance que se realiza em Portugal de dois em dois anos. Dia 15 de Agosto parti de Lisboa ás 14h com a Teresa e o Javi, com o carro cheio de comida, tendas e todas as coisas indispensáveis para acampar num festival. O destino: Elvas. Por volta das 17h chegámos e fechámos alguns dos espaços ainda abertos dum acampamento montado no dia anterior por quem nos antecedeu.
A música, que devia ter começado ás 20h, só começou muito mais tarde e os três novatos limitaram-se, nessa noite, a passear até á pista, onde as luzes negras e as faixas de luz verde libertavam cores fluorescentes. Dormiu-se cedo, exigência de acordar no dia seguinte ás 6:30h, eu preparada para perceber como iam ser os meus próximos dias: passados á beira de água a torrar, ou a dançar até não aguentar mais. Conclusão: "Bora p'á pista!!!!!!".
O programa foi todos os dias, basicamente, o mesmo. Acordava-se cedo para sair da tenda adivinhando a frescura e humidade matinal (ás vezes quase madrugal) e tomar um pequeno-almoço modesto. Á chegada da pista, sempre carregados com um garrafão e um borrifador, a primeira coisa era tirar os chinelos e sentir a terra, ainda gelada, debaixo dos pés. Uma enchente de energia percorria-me imediatamente, de proximidade com uma parte de mim ainda desconhecida mas que se foi tornando mais presente ao longo dos dias. Um Eu mais em contacto com a natureza, com a Terra. As manhãs eram passadas a dançar, com um ou outro mergulho ocasional e vários duches para refrescar do calor que se impunha á medida que o sol ficava mais alto e as cores mais claras e nítidas.
Passadas largas horas, que não se faziam notar, e, com algum esforço, abandonava a pista temporariamente para ir comer qualquer coisa, sentindo, a cada dia que passava, uma sensação de que me alimentava apenas de música e da força que sentia ao dançar e na presença de todas aquelas pessoas. Olhava para o lado e via centenas de pessoas a dançar e a sorrir, a aproveitar a música, a convivência, sentindo uma corrente de energia, como se estivéssemos todos ligados, a dar e a receber boas vibrações. Depois do almoço, voltava para a música, até começarmos a abandonar a pista aos poucos, ao final da tarde. Tomava um banho gelado, jantávamos e íamos para a tenda, dormir quase com as galinhas, preparar-nos para mais um dia.
Vi coisas que nunca tinha visto. Coisas que estavam enquadradas naquele contexto e, por isso, não me chocaram apesar da sua violência, que me pareceram naturais. Aceitei-as sem julgamentos, sem moralismos. Apercebi-me que existe quem escolha um percurso de vida completamente diferente daquele que, eu prevejo, seja o meu, quem viva numa realidade que não toca levemente na minha, porém tem gostos, desgostos, prazeres, desprazeres, amizades, amores, sentimentos, emoções, como eu. Gosto da variedade. Gosto de saber que o mundo é composto por entidades tão distintas, opostas, únicas, contudo conseguimos sempre encontrar um qualquer ponto de encontro, se estivermos dispostos a procurá-lo, se estivermos abertos a esta diversidade e a encararmos como algo positivo, algo com o qual podemos aprender um pouco mais sobre os outros e sobre nós mesmos.
Fiz coisas que nunca tinha feito. Coisas que também tiveram o seu contexto e das quais não me arrependo por saber que as aproveitei para me conhecer um pouco mais, para fortificar certezas ou abalar falácias. Essencialmente, tiveram a companhia certa: um grupo com o qual tenho visto tanto de coisas novas, que é tão diferente dos meus grupos de amigos e (talvez nem tanto) de mim, onde são todos tão diferentes, cada um com o seu sorriso, com o seu olhar, com a sua gargalhada, a sua maneira de ser. Uns mais reservados, mais distantes, outros mais dados, mais próximos, mas todos me fizeram sentir bem-vinda.
Foi a experiência mais importante daquele que já considero o melhor Verão de sempre. Posso afirmar, sem reservas: apaixonei-me pelo trance.