terça-feira, 3 de julho de 2007

Deocriste

Nome estranho e desconhecido a todos que não me conhecem muito, muito bem. Bem o suficiente para saber que é a aldeia onde a minha avó nasceu, perto de Viana do Castelo, tendo uma fábrica de papel á entrada que deita sempre um cheiro pestilento que aprendi a gostar por associar a este sítio especial.
Já dormi em todos os quartos: no que sempre foi da minha mãe, tinha antes um papel de parede florido para o qual nunca me fartava de olhar. No que, para todos os efeitos, é do meu tio Tó, mas também da minha avó, onde durmo sempre com a minha irmã e tem guardada toda a minha roupa de bebé ainda recuperável. No que não era bem de ninguém, mas era um bocadinho da minha prima Maria e agora será sempre do tio Juca, onde me lembro de dormir com as minhas duas primas no tempo em cabíamos as três na mesma cama. No que sempre foi da minha tia Guida mas já não é, onde dormi com a minha prima mais nova numa noite em que estava sem os pais, como eu precisava da companhia de alguém para dormir naquela casa distante e familiar ao mesmo tempo quando era pequena. Na sala, que sempre teve sofás-cama, quando a casa ficava cheia de família. Houve até uma tentativa das primas de passar uma noite numa tenda montada no jardim que agora é piscina e onde havia um salgueiro-chorão que me fazia imaginar um labirinto com mil e um cenários, mas a companhia de um quinto habitante (uma centopeia em cima das nossas cabeças) fez-nos gritar e rir ao mesmo tempo enquanto fugíamos da tenda, esquecendo para sempre essa ideia.
Os natais sempre foram especiais. Principalmente na outra casa, aquela mais acima, mais velha, mais assustadora, mais cheia de história(s), com quadros de fotos amareladas de pessoas sisudas que dizem que foram família. A casa onde o chão range a cada passo que se dá, e que o pai-natal nunca esquecia, pondo as prendas todas num cesto preso áquela chaminé enorme, o cesto que subia vazio enquanto os adultos apagavam as luzes e voltava cheio quando as luzes eram acendidas. O porquê de apagarem as luzes só percebi muito mais tarde.
A casa que é uma quinta, tinha vacas, porcos, coelhos, galinhas e dois tanques onde tomei muitos banhos de verão. A casa que tem um terraço com vasos onde crescem morangos óptimos, e onde, numa noite de verão há muito tempo, a família toda dançou a Lambada. Ver a nossa avó e tios-avós dançar a Lambada é uma imagem que nunca se esquece. Daquelas recordações que vamos buscar quando queremos rir á gargalhada.
É uma aldeia que está sempre em festa, ou que nós temos o azar de apanhar sempre no auge. Sim, o azar. Acordar ás 8:30h com foguetes mandados mesmo ao lado de casa e com música portuguesa, popular e de folclore aos berros com altifalante naquele pinheiro gigante que fica mesmo nas traseiras. Durante dias ouvir o Marco Paulo falar da Anita e da Joana, até finalmente admitir que tem dois amores, o Vitor Espadinha vivendo a recordar, as vozes esganiçadas das músicas do Vira (custa arranjar alguém que cante duas notas?), a rainha da noite dos D'Arrasar (ou eram os Excesso?), o medley com algumas das canções da minha infância - tia Anita do Loulé (será a mesma do Marco Paulo? A que não tem namorado e ninguém sabe porquê?), o mar que enrola na areia -, os Da Vinci e a sua música Conquistador, que me fez pular, algumas Mónicas Sintra, alguns Pacos Bandeira, até músicas que falam da mocidade portuguesa, muitos clássicos da música portuguesa.
E voltar ao conforto de Lisboa com todo um repertório de canções para cantarolar.

4 comentários:

Anónimo disse...

De facto Deocriste tem destas surpresas, sem querer e numa busca pela net encontramos Deocristenses que não conhecemos.
Parabéns pela narrativa sobre Deocriste.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

DE facto, só conhece bem Deocriste, como eu conheço, pode compreender do que fala a autora do texto. Também passei grande parte da minha infância e todas as férias em Deocriste, a minha mãe é natural de lá e o meu padrinbho construiu lá uma casa. Com efeito, é me familiar a descrição das festas de Natal, do cheiro característico da Fábrica de Celulose bem com os acampamentos (que também fazia com a minha prima). Deocriste faz, efectivamentem, parte da Minha vida.Infelizm,enete, este ano não posso passar lá as férias, mas enfim..., é pena mas certamente não vão faltar oportunidades! Parabéns á autora do texto.

miguita disse...

Eu sou de deocriste ;D


xD